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O plano antimiséria de Dilma

Por Sérgio Pardellas e Luiza Villaméa, da revista Istoé

Nos últimos dias, a presidente Dilma Rousseff colocou integrantes de pelo menos cinco ministérios, incluindo os da área econômica, para trabalhar no programa de Erradicação da Miséria, que deve ser anunciado até a segunda quinzena de maio. As reuniões vêm acontecendo no gabinete da Casa Civil, no quarto andar do Palácio do Planalto, cercadas de sigilo. O plano é uma promessa de campanha que a presidente pretende transformar na marca de seu mandato, o que explica o clima de segredo dos trabalhos de preparação. Mas ISTOÉ obteve informações sobre o caminho que vem sendo escolhido pela equipe de Dilma.

A exemplo do programa Bolsa Família, por meio do qual o governo Luiz Inácio Lula da Silva ajudou a promover a ascensão social de 28 milhões de pessoas, o beneficiário do plano antimiséria também ganhará um cartão de acesso. Com isso, se evitarão a concentração e a intermediação política na distribuição dos benefícios – terreno sempre fértil para as práticas populistas e o coronelismo. Desta vez, garante o governo, o assistencialismo é só uma das partes do programa, que prevê a retirada da miséria de até 15 milhões de brasileiros. A partir das necessidades de cada região, a presidente pretende organizar cursos de capacitação para aqueles que vivem em condições de extrema pobreza. O plano antimiséria, neste sentido, é um incentivo ao trabalho. O novo pacote incluirá ainda o programa Água para Todos, que projeta a construção de 800 mil cisternas no País.

O plano de Dilma será dirigido principalmente para um contingente de brasileiros que se concentra na região Norte, no semiárido brasileiro, e na periferia de regiões metropolitanas (leia quadro à pág. 38). Para executá-lo, o governo planeja atuar em todo o território nacional, envolvendo governos estaduais e municipais, com base em três linhas principais. A primeira delas é a ampliação do número de beneficiários do Bolsa Família, que terá um reajuste, ainda em análise, para famílias com mais filhos. A segunta intenção é levar para o mercado de trabalho uma camada da população que hoje se encontra excluída. Por fim, o governo pretende aumentar os serviços de saúde, educação, saneamento básico e habitação nas regiões mais carentes. A ideia é associar a ampliação dos benefícios sociais com o aumento das oportunidades de emprego, tanto no meio rural quanto urbano. “Vamos sobrepor o mapa da pobreza ao mapa das oportunidades”, contou um ministro de Dilma. Um levantamento da Casa Civil já constatou quais são as principais demandas do mercado de trabalho em pelo menos 75 centros urbanos. Por meio do Sistema Nacional de Empregos, o governo quer oferecer nessas regiões cursos profissionalizantes para os inscritos no programa.

O governo tem a pretensão de criar políticas públicas que facilitem a integração desses brasileiros à sociedade, a começar pela obtenção de documentos pessoais. Em relação às mulheres, antes de mais nada será necessário aumentar o número de creches do País, para que elas tenham condição de trabalhar. Para jovens que já recebem benefícios sociais – 70% das pessoas que ganham o Bolsa Família têm até 29 anos – a intenção é criar novas vagas de emprego. O projeto de Dilma estuda também formas de atuar com jovens viciados em drogas, sobretudo o crack, cujas famílias vivem na periferia das cidades. Mas as estratégias a serem usadas não estão definidas. “As drogas não destroem apenas os jovens, mas desestruturam famílias inteiras. O plano não estará completo se não dermos uma atenção para essa questão”, tem repetido Dilma em conversas com auxiliares.

Estudos encomendados pelo governo mostraram que grande parte dos miseráveis do País não tem acesso aos benefícios oferecidos pelo Estado por absoluta falta de conhecimento, o que deve ser enfrentado com investimentos em comunicação. Profissionais serão treinados nos Estados e municípios para orientar os cidadãos situados abaixo da linha da pobreza sobre os seus direitos e como poderão ter acesso a eles. Funcionarão também como uma espécie de educadores. “É inacreditável como tem muita gente isolada, sem nenhuma informação, nas regiões metropolitanas”, disse a ministra de Desenvolvimento Social, Tereza Campello, uma das coordenadoras do programa, em recente reunião com integrantes do primeiro escalão federal.

Para desenvolver o programa, o governo vai estabelecer uma linha oficial de pobreza. O valor, em estudo pelo Palácio do Planalto, é de R$ 138 no que se refere à renda por pessoa. O objetivo é completar a renda daqueles que recebem menos do que este piso, o que geraria uma despesa de R$ 21,7 bilhões por ano. A linha de pobreza foi proposta pela Fundação Getulio Vargas, que possui um representante nos debates do Palácio do Planalto, o economista-chefe do Centro de Políticas Sociais, Marcelo Neri. “O custo do programa ficará menor ao longo do tempo, se o bolo continuar a crescer com mais fermento entre os mais pobres”, diz ele. O economista tem participado das reuniões na condição de consultor.

Até hoje, diversas instituições adotaram critérios distintos para medir a quantidade de miseráveis no País, futuro público-alvo das iniciativas do governo. Nenhum critério, porém, jamais havia sido adotado como oficial pelo governo. Nas reuniões do Palácio do Planalto, estima-se que essa parcela da população varia entre nove milhões e 15 milhões de pessoas. Os números ainda não estão fechados, pois a classificação não levará em conta apenas a renda, mas o acesso a serviços públicos, como o transporte e a educação. Esse mapa tem como base um cadastro ampliado do próprio Bolsa Família, enviado aos beneficiários no início do ano para atualização.

Para que os trabalhos sejam coordenados com Estados e municípios, a ministra do Desenvolvimento Social já se reuniu com vários governadores. Na segunda-feira 18, o encontro foi com o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB). Entre outros pontos, eles discutiram a possibilidade de o governo capixaba criar um programa de transferência de renda complementar ao Bolsa Família. A sugestão deve ser levada também para outros Estados.

A equipe encarregada de elaborar o plano antimiséria vem recebendo até propostas vindas de fora do governo. Uma das mais recentes foi feita pelo presidente do conselho da pequena empresa da Federação do Comércio paulista, Paulo Feldman. Ele defende o estímulo ao empreendedorismo como uma forma de combate à miséria. Feldman lembra que seria impossível criar empregos em número suficiente para atender a todas as pessoas que passam fome. Mas com políticas de apoio ao espírito empreendedor, como o microcrédito, este espaço poderia ser preenchido. O economista lembrou as experiências da Índia, com mães que acabaram se tornando boas costureiras depois que conseguiram comprar suas primeiras máquinas por meio de microcrédito. O mesmo aconteceu com boa parte da juventude que conseguiu obter renda a partir de incentivos para compra de laptops. Em ambos os casos, coube ao Estado promover não só acesso ao crédito, mas também cursos profissionalizantes. No Brasil, os auxiliares de Dilma já fazem levantamento sobre a disponibilidade desses cursos pelos governos estaduais.

No combate à pobreza o Brasil tem demonstrado avanços. Em 1990, 25,6% dos brasileiros viviam com uma renda inferior ao critério da pobreza extrema estabelecido pela ONU. Em acordo firmado na Cúpula do Milênio, o Brasil se comprometeu a reduzir este número pela metade até 2015. Em 2008, porém, o País superou essa meta. Dilma acredita que poderá ter o mesmo desempenho encarando a miséria absoluta com programas que promovam a inclusão, distribuição de renda e acesso à cidadania.

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